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A direita ganha em Portugal – trabalhadores confrontam medidas de austeridade

Joana Ramiro

Como a vitória da direita nestas últimas eleições, Joana Ramiro analisa como a social-democracia, o reformismo e uma esquerda parlamentarista deixou manchada a herança da Revolução dos Cravos.

As eleições legislativas em Portugal a 5 de Junho resultaram numa clara vitória da direita. O Partido Popular Democrático/Partido Social-Democrata (PPD/PSD) venceu com 39 por cento dos votos. Não foi o suficiente para formar governo, mas o mínimo necessário para chegar aos democratas cristãos do Centro Democrático Social – Partido Popular (CDS-PP) e formar uma coligação de direita. Os líderes de todos estes partidos promovem cortes drásticos para reduzir os gastos estatais, para melhorar o rating de crédito do país com o Banco Central Europeu.

Mas a resposta da esquerda foi lamentável. Num país em dificuldades, com dívidas, desemprego crescente em mais de 12 por cento e com um iminente “bail-out” por parte da UE-FMI-Banco Central Europeu (tróica) os maiores perdedores foram, dramaticamente, a esquerda portuguesa. O Partido Socialista (PS) incumbente perdeu por cerca de 700.000 votos, perdendo assim 23 dos seus deputados e a sua hegemonia em todos mas três distritos do país. Expulsos do Governo o PS é agora o principal partido da oposição. Quanto ao promissor Bloco de Esquerda (BE), com um voto de 288.776 viu perder metade de seus deputados, deixando a coligação de pequenas tendências de extrema-esquerda em crise. Em debate no Bloco está a questão do pagamento da dívida – a maioria dentro do partido concorda que deve ser paga, discordando com o plano e estratégia de reembolso – uma posição terrivelmente reformista em face à crise económica.

Dois partidos de esquerda, no entanto, recusam o pagamento da dívida para cm o Banco Central Europeu. O Partido Comunista Português, que domina os sindicatos, em usual coligação com os Verdes (a Coligação Unidade Democrática ou CDU). A coligação reuniu 440.850 dos votos, um aumento modesto, resultando em mais um deputado no parlamento. Os maoístas do Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses / Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado (PCTP / MRPP) recolheram mais de 60 mil votos, sob o lema “estas eleições foram uma fraude” e exigindo a omissão do empréstimo.

O grande vencedor destas eleições, porém, foi a abstenção que atingiu o recorde de 41 por cento.

O fraco desempenho para a esquerda e o aumento do abstencionismo reflecte com precisão o estado da consciência política em Portugal e são uma consequência do fracasso da esquerda revolucionária em resolver algumas das questões mais importantes na sociedade portuguesa. O sucesso do PPD /PSD não reflecte mais do que a desilusão total com a retórica reformista social-democrata utilizada pelo Partido Socialista. Perante a deterioração exponencial da economia portuguesa o antigo primeiro-ministro José Sócrates mostrou ter pouco ou nada de esquerda “socialista”, adoptando totalmente os ditames neoliberais de Merkl, Sarkozy e outras elites políticas europeias. O apoio incondicional que deu às medidas de austeridade, em detrimento dos serviços públicos portugueses fê-lo perder o voto trabalhador, enquanto, com óbvios salamaleques à burguesia internacional, afastou a classe média-baixa, nacionalista e regionalista. Quanto ao Bloco de Esquerda, divisões internas à parte, foi principalmente incapaz de abordar o proletário sindicalizado, cuja liderança é ainda fortemente controlada pela classe burocrata do Partido Comunista. Este facto deve-se principalmente à crescente abordagem parlamentarista do Bloco de Esquerda, restringindo as suas redes de apoio às massas urbanas, muitas vezes educadas, intelectuais de classe média e aos membros das novas camadas informes da sociedade, como a de aqueles que trabalham em novas áreas de serviço e média (geralmente recém-licenciados em condições de emprego precárias). No entanto, o Bloco de Esquerda parece ter perdido o jeito, arrecadando apenas 5,2 por cento do total dos votos.

O descontentamento dos trabalhadores jovens altamente qualificados tem sido respondido com políticas de esquerda obviamente insatisfatórias, com retórica vaga sobre a agenda económica e política e com uma certa inércia por parte do Bloco de Esquerda. A juventude não está apática, mas sim decepcionada e alienada da esquerda portuguesa, preferindo as ideologias de liberalismo eclético e autonomistas. É a sua ansiedade sobre o futuro sombrio do país, que a detém sobre as promessas falaciosas neo-conservadoras de recuperação económica. A falta de esperança levou a uma classe trabalhadora jovem desalentada, sem estratégia e, sobretudo, em falta de um representante, de um partido revolucionário.

As lições a aprender com as eleições portuguesas e com a perigosa tendência europeia a um aumento na votação em partidos nacionalistas e conservadores em tempos de crise não é apenas o fascínio com o conservadorismo por parte das pequenas classes médias, mas significativamente, o modo desajustado com que a extrema-esquerda até agora tem liderado a luta contra as medidas de austeridade neo-colonialistas capitalistas. O Bloco de Esquerda, precisa compreender que a social-democracia parlamentar reformista não é melhor que o apoio ao FMI, que a promoção do mercado livre, que a reacção. Revolucionários em Portugal precisam de agir e sem companheiros na luta com os desempregados, os trabalhadores precários, os jovens, a comunidade imigrante e toda a classe trabalhadora. Os sindicatos têm que lutar não apenas por um dia de greve geral, mas por dias consecutivos de greve contra as medidas de austeridade. É preciso que haja unidade no movimento, não apenas como caminho para alcançar lugares no parlamento, mas para tomar as ruas – uma alternativa que muitos estão já prontos a assumir.

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